Revista Reformador

Auxiliares da desencarnação*

“Ó caminhos das almas, misteriosos caminhos do coração! É mister
percorrer-vos, antes de tentar a suprema equação da vida eterna! É
indispensável viver o vosso drama, conhecer-vos detalhe a detalhe,
no longo processo do aperfeiçoamento espiritual!…” – André Luiz¹

Mário Frigéri**
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Resumo

Todos os seres humanos passarão pelo processo da desencarnação um dia: os que tiverem merecimento receberão assistência espiritual especializada para desembaraçar-se dos liames da carne; os demais, estarão submetidos à lei básica universal da misericórdia divina.

Palavras-chave

Desencarnação; processo; assistência espiritual aos que merecem.

As pessoas que têm vontade de conhecer como se processa a atividade das equipes espirituais que auxiliam as criaturas humanas a desencarnar (desencarnar: termo espírita para o nosso conhecido morrer), de[1]vem ler o livro Obreiros da vida eterna, de André Luiz, recebido por Francisco Cândido Xavier e publicado pela FEB Editora.

Esse livro narra em detalhes a assistência prestada pelo instrutor Jerônimo e sua equipe a cinco pessoas em fase terminal de existência. A equipe procede da cidade espiritual Nosso Lar e é constituída por vários colaboradores especializados, entre eles, André Luiz, que faz também a reportagem dos casos.

O grupo trabalha em nome de Jesus, sem qualquer coloração religiosa, por isso irá auxiliar o desenlace de três espíritas (Dimas, Fábio e Adelaide) um católico (Cavalcante) e uma evangélica (Albina), cujas existências chegaram ao fim. Por determinação superior, porém, Albina teve sua desencarnação adiada por alguns meses, para atender a necessidades espirituais de sua família; por isso, apenas quatro dos pacientes receberão a assistência necessária para aquele fim.

Falaremos nesta apertada síntese apenas de Adelaide, para demonstrar como os parentes e amigos podem colaborar com as equipes espirituais na desencarnação de um ente querido.

Adelaide, já em idade avançada, era responsável por antiga e nobre Instituição espiritista-cristã dedicada à assistência a enfermos e ao amparo materno a órfãos. Sempre foi discípula fiel do divino Mestre e, apesar das dificuldades e aflições decorrentes de seu longo e estafante trabalho, perseverou até o fim.

Encontrava-se agora tranquila, em seu leito de morte, esperando a hora da partida. Para facilitar seu desprendimento da carne, ela, em desdobramento espiritual, foi orientada por seus mentores a confiar a Jesus suas preocupações finais, transferindo para outras mãos o precioso fardo de suas responsabilidades na Instituição. Que convertesse saudades em esperanças e desatasse os elos mais fortes que a ligavam à matéria, em atendimento à determinação divina.

Para colaborar com a equipe que a assistia, foi-lhe dito que, em ocasiões como essa, a resolução pessoal é quase tudo. Ela deveria ajudar a si mesma, libertando a mente dos elos que a imantavam a pessoas, acontecimentos, coisas e situações da vida terrena. Nada a deveria reter. Quando fosse chamada, não olhasse para trás. Que se lembrasse da ordem imperativa de Jesus: “[…] Lázaro, vem para fora!” (João, 11:43), e se afastasse do envoltório de carne como Lázaro se afastou da gruta.

O apego da equipe

Ela argumentou, porém, que havia um problema: a sua equipe. Desde muitos anos, organizara na Instituição um grupo muito grande de pessoas dedicadíssimas, principalmente senhoras, que a estimavam profundamente. Visto com olhos espirituais, seu quarto de dormir naquela Casa parecia agora uma intrincada malha de pensamentos retentivos dessas pessoas queridas, a embaraçar- -lhe a partida. Ninguém desejava sua desencarnação, pois as vibrações, desejos e preces de todos eram no sentido de que ela permanecesse entre eles. E ela se sentia amarrada ao corpo decrépito por esses pensamentos, como um balão ao poste.

Em vista disso, os mentores organizaram naquela Casa uma reunião espiritual, na noite que antecedeu o programado passamento, onde, durante as horas do repouso noturno, foram agrupados os Espíritos que constituíam a equipe humana de Adelaide, para a necessária orientação.

Nessa reunião eles foram esclarecidos, de forma fraterna porém enérgica, de que cooperação e carinho são estimulantes sublimes na obra do bem, mas que é preciso evitar o egoísmo que se expressa na forma de tirania sentimental. A ternura mal manifestada pode transformar-se em idolatria. A aflição com que todos intentavam reter a missionária na carne era filha do medo e da falta de confiança no futuro. Não se devem converter companheiros de luta em oráculos erguidos em pedestais de barro. Que não depusessem na fronte da desencarnante a coroa da responsabilidade total pela Instituição, cujo peso deveria ser dividido, dali para a frente, entre todos os que remanescessem na Casa.

Tudo isso lhes foi dito de maneira firme, porém paternal, para elevar-lhes a compreensão, a fim de que se desprendessem, mentalmente, da devotada e digna servidora, que deveria preceder a todos na grande viagem para o Mundo Invisível. Ao término da reunião, foi feita uma prece, em que se suplicavam a Deus bênçãos de compreensão e paz para todos os presentes.

Na manhã seguinte, Adelaide desencarnou tranquilamente, pois se extinguiram as correntes mentais desequilibradas, geradoras de filamentos fluídicos que a retinham ao corpo físico e que procediam de seus amigos e correligionários leais, mas invigilantes. Abriu-se a Casa à visitação geral. Os cooperadores encarnados, embora não guardassem na retentiva da memória recordações minuciosas da reunião espiritual, sustentaram discreta atitude de respeito, serenidade e conformação. Depois de orar fervorosamente, após o trespasse, Adelaide, cercada de numerosos amigos do Plano Invisível, partiu em companhia da equipe de Jerônimo rumo às paradisíacas regiões celestiais…

O exemplo de Adelaide é uma preciosa lição para todos nós, caso tenhamos em nossos lares parentes queridos, às vezes já idosos, em processo de partida para o outro plano. É importante cercá-los nessas ocasiões de muita assistência, amor e carinho, mas sem prendê-los magneticamente à matéria, porque as emissões mentais de retenção funcionam como rede invisível que enleia o desencarnante, inibe-lhe o desprendimento e lhe causa profunda aflição psíquica e emocional.

O poder da prece

Como vimos, sentimentos desequilibrados de apego podem prejudicar em vez de ajudar. Nossos pensamentos e preces devem ser no sentido de suplicar a Deus que seja feita a sua vontade e não a nossa, tanto para a recuperação quanto para a libertação da alma, a fim de não nos tornarmos pedra de tropeço para os emissários do Senhor, que certamente virão em socorro de nosso ente querido. É o que Jesus ensina, no Pai-Nosso: “Seja feita a vossa vontade, assim na Terra como no Céu”. Esse procedimento não é uma atitude de frieza ou distanciamento sentimental, como pode parecer às pessoas que ainda não refletiram maduramente sobre o assunto, mas de responsabilidade moral e ética perante a realidade da vida.

A morte do corpo físico é sempre uma bênção para o Espírito que cumpriu dignamente seus deveres neste mundo; e para o que não os cumpriu, será um novo recomeço e uma nova oportunidade de acertar o passo, porque, como diz o Senhor, em Ezequiel, 33:11, “Deus não quer a morte do pecador, mas que ele se converta, deixe o mau caminho e viva”.

Em todo esse procedimento, é inestimável o valor da oração. Para o instrutor Aniceto,

[…] o trabalho da prece é mais importante do que se pode imaginar no círculo dos encarnados. Não há prece sem resposta. E a oração, filha do amor, não é apenas súplica. É comunhão entre o Criador e a criatura, constituindo, assim, o mais pode[1]roso influxo magnético que conhecemos. […].²

Para o instrutor Alexandre,

[…] A criatura que ora, mobilizando as próprias forças, realiza trabalho de inexprimível significação. Semelhante estado psíquico descortina forças ignoradas, revela a nossa origem divina e coloca-nos em contato com as fontes superiores. […]

[…]

[…] Toda prece elevada é manancial de magnetismo criador e vivificante, e toda criatura que cultiva a oração, com o devido equilíbrio do sentimento, transforma-se, gradativa[1]mente, em foco irradiante de energias da Divindade.³

Para o instrutor Gúbio,

[…] A prece sentida aumenta o potencial radiante da mente, dilatando-lhe as energias e enobrecendo-as, enquanto a renúncia e a bondade educam a todos os que se lhes acercam da fonte, enraizada no sumo bem. Não basta, dessa maneira, exteriorizar a força mental de que todos somos dotados e mobilizá-la. É indispensável, acima de tudo, imprimir-lhe direção divina. É por esta razão que pugnamos pelo Espiritismo com Jesus, única fórmula de não nos perdermos em ruinosa aventura.⁴ (Grifo nosso).

Como foi visto, essa mensagem traça importantes diretrizes espirituais para nosso comportamento diante da morte de alguém de nosso convívio, que é um evento inevitável para todo ser humano. Como o Espírito é imortal e todos evoluímos em grupo amparando-nos uns aos outros, a vida sucede à morte e a morte sucede à vida.

E isto acontecerá – como ensina o Apóstolo Paulo – até “[…] que este corpo corruptível se revista da incorruptibilidade, e que o corpo mortal se revista da imortalidade” (1 Coríntios, 15:53), porque, “[…] se há corpo natural, há também corpo espiritual” (1 Coríntios, 15:44). E é com esse corpo espiritual que penetraremos um dia na Vida Eterna, quando deixarmos o outro hirto e estirado no leito.

REFERÊNCIAS:
¹ XAVIER, Francisco Cândido. Nosso lar. Pelo Espírito André Luiz. 64. ed. 15. imp. Brasília, DF: FEB, 2020. Mensagem de André Luiz.
² XAVIER, Francisco Cândido. Os mensageiros. Pelo Espírito André Luiz. 47. ed. 14. imp. Brasília, DF: FEB, 2020. cap. 25 – Efeitos da oração.
³ XAVIER, Francisco Cândido. Missionários da luz. Pelo Espírito André Luiz. 45. ed. 13. imp. Brasília, DF: FEB, 2020. cap. 6 – A oração.
⁴ XAVIER, Francisco Cândido. Libertação. Pelo Espírito André Luiz. 33. ed. 14. imp. Brasília, DF: FEB, 2021. cap. 11 – Valiosa experiência.