A missão educativa da família
Marcus De Mario*
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Resumo
Educar é diferente de cuidar, tanto quanto de instruir, devendo os pais assumir a missão de educar os Espíritos reencarna dos que recebem como filhos, dar-lhes bons exemplos, assim como fazendo a correção de suas más tendências, cumprindo desse modo a missão da família como instituição humana formadora da sociedade.
Palavras-chave
Espiritismo; educação; educar; exemplos; amor; pais; filhos.
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A diferença entre educar e cuidar, pelo menos para os educadores, não suscita qualquer dúvida, todos sabem a importância da educação como instrumento de formação do ser em desenvolvimento, e que educar é utilizar-se das ferramentas de um processo pedagógico que visa a plena capacitação intelectual e moral desse ser, ferramentas como o conteúdo curricular, os temas transversais, os jogos, a experiência através de laboratórios, as pesquisas etc.
Educar é muito mais do que cuidar, do que preocupar-se apenas com a alimentação, a higiene, a roupa, o brinquedo etc., ferramentas que também fazem parte do processo educacional, mas que, quando utilizadas de forma isolada ou combinadas com as ferramentas do egoísmo humano, mais deseducam do que educam.
Vamos a alguns exemplos para ilustrar a diferença entre educar e cuidar.
Passear com um bebê no calçadão, trocar suas fraldas, dar-lhe banho são tarefas que uma babá pode fazer, profissionalmente cuidando do mesmo, mas somente a mãe pode amamentá-lo, pode abraçá-lo com afeto, pode dirigir-lhe palavras de amor, pode ensiná-lo a dar os primeiros passos e orientá-lo com exemplos dignos.
Os pais podem cuidar dos filhos mantendo a carteira de vacinação em dia, matriculando-os na escola, comprando-lhes as roupas necessárias, mas se não dão bons exemplos, se ficam a criticá-los para parentes, vizinhos e amigos e se utilizam da violência por qualquer motivo, podem estar cuidando, mas não educando.
Um professor pode dominar o conteúdo de sua matéria curricular e estar presente na escola para todas as formalidades pedagógicas, mas se descarrega seus problemas nos alunos, se exerce apenas o ensino em sala de aula, sem nenhuma preocupação com o resto, estará cuidando do conhecimento memorizado dos alunos, mas não conseguirá educá-los, pois longe estará da consciência deles.
Diante de uma nova conjuntura social e uma nova visão do futuro, quando se pretende estabelecer uma sociedade que seja ética, a formação da cidadania é um processo de educação das consciências mais profundo do que cuidar de uma criança.
Mas a questão do educar, apesar do enunciado acima, não está clara para a maioria das pessoas, sejam elas professores ou pais, que continuam a desrespeitar estágios de desenvolvimento da criança e do adolescente, continuam a não ensinar com amor, continuam a utilizar a violência para disciplinar e dar limites, continuam a se preocupar com o diploma e não com a formação da consciência, enfim, persistem em valorizar todos os aspectos materiais da existência humana e a menosprezar, ou dar menos atenção, aos aspectos morais e espirituais da vida.
A inversão de valores, a não consideração da força do exemplo estão formando gerações egoístas e imediatistas, com jovens insensíveis e pouco preocupados com a sociedade como um todo.
Uma falsa educação está predominando, causa da corrupção, da má distribuição de riqueza e tantos desajustes sociais, porque tudo está baseado numa vida do ponto de vista imediato material, quando deveria o homem preocupar-se primeiro não com a beleza física ou com as finanças, mas com a formação do caráter da criança, com a sensibilização dos sentimentos, com o construir uma consciência individual democrática, participativa e solidária, consciência essa fundamental para termos uma nova sociedade.
Educar e cuidar
Educar também é cuidar. Cuidar nem sempre engloba o educar, da mesma maneira que educação pressupõe a instrução, mas a instrução nem sempre realiza a educação.
Frustrações, desequilíbrios psicológicos, traumas estão intimamente ligados a um passado de cuidados desacompanhados da verdadeira educação. As histórias se repetem nas salas de aula, nos consultórios terapêuticos e nas conversas em grupos de amigos. São lembranças amargas de pais que não dialogavam, que não davam bons exemplos. “Sempre tive de tudo, disso não posso me queixar, mas sentia a falta da presença de meu pai e a indiferença de minha mãe; talvez seja por isso que tenho dificuldades nos meus relacionamentos mais íntimos e até mesmo nos profissionais”.
Educar é diferente de cuidar, bem diferente…
Hoje, no mundo globalizado, em que as tecnologias da informação e das comunicações predominam, percebemos o quanto é pernicioso, tanto para o desenvolvimento individual quanto social, cuidarmos apenas do acesso ao conhecimento sem a correspondente formação de bons hábitos e do senso moral.
Enquanto estivermos presos ao “cuidar”, explosões irracionais de instintos violentos continuarão a eclodir, assim como fanatismos e pessoas de mau caráter estarão infestando a sociedade, sem que os especialistas de plantão consigam dar resposta satisfatória à famosa pergunta: por quê?
Educar é a palavra-chave, no exato e profundo entendimento de “desenvolver harmonicamente as potencialidades do ser humano”, ser integral – inteligência e sentimento – que todos somos. Faça-se o educar e tudo mais será consequência: justiça social, paz, felicidade etc.
Os cuidados que temos com as crianças e com os adolescen tes, Espíritos reencarnados, são muitas vezes relaxados e mal fei tos porque não temos amor, por que não queremos nos dedicar ao processo de educar, que pres supõe cuidar, orientar, estimular, criar bons hábitos, exemplificar, acompanhar, dar de si mesmo, renunciar e, acima de tudo, amar sem condições preestabelecidas e retorno definido.
A culpa pela existência dos males sociais não está exclusivamente nos governantes, ela cabe também a cada um de nós, responsável pela educação das novas gerações e pelo estilo de vida que caracteriza a sociedade em que vivemos. Quem não educa a si próprio, não poderá realizar a contento a educação dos outros, tendendo a repassar vícios do caráter e reforçá-los com maus exemplos, atitudes equivocadas que lhe orientam o viver. A autoeducação e o amor são as bases do educar, como nos mostra a Doutrina Espírita, exaltando nossa imortalidade e nosso destino, que é chegar à perfeição tanto intelectual quanto moral, e o melhor lugar para desenvolver esse processo, não temos dúvida, é a família.
Exemplos de amor
O exemplo é o instrumento de educação mais eficaz que os pais podem utilizar para a boa formação de seus filhos, e o amor é o sentimento que mais deve ser exemplificado.
Exemplificar o amor não é tarefa das mais fáceis para a maioria dos pais, porque estão envolvidos por falsas visões do homem e do mundo, dando preferência a tudo que corresponde ao “cuidar”. Sonham com o futuro dos filhos e esses sonhos só conseguem gravar cenas de formação universitária, crescimento profissional, ganhos financeiros, respeito social, casamento com o príncipe ou princesa dos melhores romances, construção de belos e lucrativos negócios, casa com todo o conforto necessário para uma existência digna. Tudo que é material está presente nos sonhos, e se felicitam quando os filhos começam a construir esses sonhos, mesmo que à custa da infelicidade alheia.
Um bom exemplo disso é a luta que a maioria faz pelos direitos de cidadania, confundindo-os com os direitos do consumidor. Exigem-se leis, tribunais, punições e a garantia da troca da mercadoria ou a devolução do capital empregado, e tudo isso é ensinado na escola como formação cidadã e participação democrática na sociedade, mas quando se trata da defesa do meio ambiente, do não desperdício de alimentos, do uso racional da energia, do combate à miséria e outros temas de relevância, muitos pais se colocam na defensiva, preocupados em defender interesses pessoais e privilégios familiares.
O amor transcende tudo isso. É sentimento que não depende de manifestações de caráter material. E quando se manifesta, por exemplo, por meio da entrega de um presente ou uma lembrança, o sentimento envolvido faz de um simples bilhete ou de algumas palavras o mais belo e profundo de todos os presentes.
Exemplificar o amor é abraçar os filhos.
Exemplificar o amor é beijar a pessoa amada.
Exemplificar o amor é estar presente em todos os momentos.
Exemplificar o amor é compreender e perdoar.
Exemplificar o amor é não colocar os familiares uns contra os outros.
Exemplificar o amor é ser solidário, sempre.
Exemplificar o amor é chorar e também rir.
Exemplificar o amor é dar afeto e estar pronto para recebê-lo.
Exemplificar o amor é fazer o que dizemos.
Exemplificar o amor é fazer todo esforço possível para amar sem distinções.
Os pais que pautam sua vida nos exemplos de amor, de solicitude, de renúncia, de amparo, de convivência amiga, harmonizam o lar e conseguem formar consciências éticas porque estão trabalhando a educação moral dos filhos. Os filhos não querem intolerância, amargura, violência, autoritarismo, nem liberdade excessiva, querem amor e bons exemplos.
*N.A.: Educador, escritor e palestrante; editor-chefe da Revista Educação Espírita; produtor e apresentador do programa Espiritismo e Educação; publica o canal Orientação Espírita; coordena o Seara de Luz, grupo de estudo espírita online; possui 40 livros publicados.